Como os efeitos das mudanças climáticas afetam a agricultura

Os efeitos das mudanças climáticas têm afetado a agricultura de diversas formas nos últimos anos, com estiagens, geadas e chuvas intensas

Efeitos das mudanças climáticas (Foto: Divulgação)

A estiagem que afetou áreas de agrícolas na região Centro-Sul do Brasil em 2022 foi responsável pela redução de 15,5% na produção de soja, principal commodity do país.

Além dela, o excesso de chuvas e as geadas afetaram áreas de café e frutas na Bahia e Minas Gerais, com perdas milionárias, agravadas pelo aumento dos custos de produção.

Já as pragas e doenças, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), reduziram em 40% a produção global de alimentos, gerando insegurança alimentar em todo o mundo.

Segundo especialistas, esses problemas são efeitos das mudanças climáticas na agricultura, que pode enfrentá-los por meio do uso de práticas sustentáveis, gestão rural eficiente e uso de tecnologias digitais.

Algumas delas são o Plantio Direto, o MIP (Manejo Integrado de Pragas), o Plano ABC (agricultura de baixo carbono) e o Sistema ILPF (Integração-Lavoura-Pecuária-Floresta), já difundidas há anos no país, mas necessitam ser mais ampliadas. Leia mais neste artigo!

Quais os efeitos das mudanças climáticas?

Os efeitos das mudanças climáticas são o aumento da temperatura, incêndios e secas, tempestades severas, derretimento de geleiras e elevação do nível dos oceanos, a perda de espécies de animais e plantas e a redução da produção de alimentos.

Com isso, eleva-se o risco à saúde (novas doenças e expansão mais rápida delas) e o desmatamento, além da pobreza extrema, o que resulta no deslocamento de populações.

O principal influenciador do aumento da temperatura global são as emissões de GEEs (gases de efeito estufa) – gás carbônico (CO2), gás metano (CH4) e óxido nitroso (N2O).

Segundo a ONU, as emissões desses gases na atmosfera devem fazer aumentar a temperatura global em 2,7ºC até o final deste século.

Área de café arábica atingida por geadas em Minas Gerais em 2021 (Revista Cafeicultura)

Durante a COP27, a Conferência do Clima, realizada em Sharm el-Sheikh, no Egito, foi divulgado que em 2022 os países devem emitir 36,6 bilhões de toneladas de CO2.

Com isso, o aumento da temperatura deve exceder o limite de 1,5ºC em nove anos e o de 2ºC em 30 anos. Não à toa, há uma preocupação dos cientistas com o agravamento dos efeitos das mudanças climáticas.

E não só cientistas, mas também o setor econômico global, tendo em vista que muitos desses efeitos causam a perda da infraestrutura necessária para o bom desenvolvimento dos negócios em todo o mundo, sobretudo o supply chain – ou cadeia de suprimentos.

Principais causas das mudanças climáticas

As principais causas das mudanças climáticas, de acordo com cientistas, são as emissões de gases de efeito estufa, que encobrem a terra e retém o calor emitido pelo Sol.

Uma das principais responsáveis pelas emissões desses gases, segundo ONU, são as usinas geradoras de energia elétrica e de calor por conta da queima de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás natural).

Assim, os cientistas defendem a expansão das energias renováveis, o que já vem sendo feito por parte do Brasil, onde há 828 parques eólicos em operação (725 no Nordeste), com capacidade de geração de 22.000 MW de energia.

Já os parques de energia solar, outra importante fonte de energia renovável, têm 20 GW de capacidade operacional, sendo 13,478 GW de energia distribuída e 6,523 GW de energia centralizada, conforme dados da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica).

Outras causadoras das mudanças climáticas são as fábricas e indústrias que produzem cimento, aço, ferro, eletrônicos, plásticos e roupas, dentre outros, por conta também da elevada emissão de gases em seus processos fabris.

Associadas a isso, ocorre em áreas de mata nativa, com destaque no Brasil para a Amazônia, principal bioma, além do Cerrado e Mata Atlântica, o avanço do desmatamento. 

As árvores, quando cortadas, liberam o carbono armazenado, o que limita a capacidade de as florestas absorverem o CO2.

Outros setores que contribuem para o aumento das emissões de gases de efeito estufa são o de transporte, o de produção de alimentos e o de moradias em edifícios, devido ao alto consumo de energia elétrica. 

Por conta disso, os países mais desenvolvidos são os que mais contribuem para o aumento das mudanças climáticas.

O que é o efeito estufa?

O efeito estufa é um fenômeno decorrente do aquecimento do planeta.

Os gases oriundos da queima de combustíveis fósseis agem como um grande cobertor em torno da Terra, o que retém o calor do sol e gera aumento das temperaturas.

Por conta disso, as secas têm sido cada vez mais intensas, assim como os incêndios, os problemas causados pelo aumento do nível do mar, com destruição de infraestruturas voltadas ao turismo, além de inundações, tempestades e perda da diversidade.

Um dos principais GEEs é o CO2 (Rocket cdn.me)

Agronegócio e os efeitos das mudanças climáticas

Quando se fala em agronegócio e nos efeitos das mudanças climáticas, o setor tem papel de grande importância, tanto por conta das emissões de GEEs quanto pela redução dos gases.

Um relatório de 2021, por exemplo, apontou que, mesmo com práticas conservacionistas, o agronegócio brasileiro foi o setor que liderou as emissões de GEEs, com 577 milhões de toneladas de CO2 emitidas, de um total de 2,6 bilhões de toneladas.

Emissões de gases de efeito estufa do Brasil de 1990 a 2020 (Seeg Brasil)

Conforme a tabela, as emissões do agronegócio só perdem para as atividades ligadas à mudança de uso da terra e floresta, que se relacionam com desmatamentos e queimadas.

De acordo com o relatório, as principais emissões de GEEs no agronegócio são oriundas da fermentação entérica (decorrente da ruminação de bovinos), dos solos manejados, do cultivo de arroz, do manejo de desejos animais e da queima de resíduos agrícolas.

Tabela mostra principais emissores de GEEs no agronegócio no Brasil (Seeg Brasil)

Por isso, o setor deve buscar a ampliação das práticas conservacionistas, já que depende do clima mais estável para garantir a produção. E como fazer isto? Leia mais abaixo!

Como reduzir os efeitos das mudanças climáticas?

Ao longo de décadas, a agricultura brasileira tem passado por importantes transformações em sua forma de produção que fizeram o país deixar de ser importador de alimentos para ser um dos principais produtores e exportadores do mundo.

Segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), entre 1975 e 2020, a produtividade agrícola cresceu 400%, enquanto a área de produção dobrou, conforme a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária).

Isso fez com que o Brasil, segundo o USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), chegasse a liderança mundial, entre 187 países, com destaque para a soja, café, proteína animal (criação de bovinos), cana-de-açúcar e laranja, dentre outros.

Para se manter entre os maiores produtores mundiais de alimentos, é preciso uma gestão eficiente das fazendas que proporcione cada vez mais poder de competitividade, e isso envolve a redução/mitigação dos riscos gerados pelos efeitos das mudanças climáticas.

A gestão eficiente passa pela utilização das ferramentas de agricultura de precisão, introduzidas no país na década de 1990 pela Embrapa e que hoje possuem grande difusão nas áreas agrícolas do país, sobretudo de grãos.

A agricultura de precisão é uma técnica de gestão da fazenda que faz uso de tecnologias para promover o uso racional de insumos, o que gera redução de custos e baixo impacto ambiental.

Uma das principais formas de praticar a agricultura de precisão é por meio do software de gestão agrícola da Perfarm, onde é possível obter análises de dados que vão permitir você tomar decisões mais assertivas e em pouco tempo.

Veja abaixo as principais práticas que você deve implantar em sua fazenda.

Planos ABC e ABC+

O Plano ABC (agricultura de baixo carbono) é uma das principais iniciativas públicas voltadas para promover a produção agrícola brasileira com sustentabilidade ambiental.

O plano tem uma linha de crédito específica, o Programa ABC, por meio da qual é possível obter financiamento público para adoção de tecnologias sustentáveis na propriedade rural. 

Criado em 2012, o Plano ABC foi atualizado recentemente pelo Governo Federal, com o lançamento do ABC+, chamado de Plano Setorial para Adaptação à Mudança do Clima e Baixa Emissão de Carbono na Agropecuária, para o período de 2020-2030.

A meta, segundo o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), é “promover a adaptação à mudança do clima e o controle das emissões de GEEs na agropecuária brasileira, com aumento da eficiência e resiliência dos sistemas produtivos”.

Até 2023, o ABC+ visa:

  • ampliar em 30 milhões de ha as áreas destinadas à recuperação de pastagens degradadas;
  • em 12,58 milhões de ha as áreas com o Sistema Plantio Direto;
  • em 10,10 milhões de ha as áreas com ILPF;
  • em 4 milhões de ha as áreas com florestas plantadas;
  • em 13 milhões de ha as áreas com adoção de bioinsumos;
  • em 3 milhões as áreas com sistemas de irrigação;
  • em 208,40 milhões de metros cúbicos a adoção de manejo de resíduos da produção animal;
  • e em 5 milhões os bovinos em terminação intensiva.

Plantio Direto

Incluso entre as metas para ampliação da sua adoção nas fazendas do Brasil, o Sistema Plantio Direto tem quase 80 anos e é uma das principais técnicas agrícolas que contribuíram para o impulso no setor agrícola brasileiro, sobretudo da produção de grãos.

Praticado em todas as regiões agrícolas do país, o Plantio Direto consiste em uma técnica que favorece à recomposição da estrutura física e química do solo, por meio do plantio sobre a “palha”, como é chamada a matéria orgânica restante do cultivo anterior.

Essa palha favorece a maior retenção de água da chuva no solo, reduz a temperatura e a erosão, além de proporcionar menor perda de nutrientes e aumentar a fertilidade. 

Com o Plantio Direto, são dispensados serviços que revolvem o solo e reduzem a sua vida útil, como o uso do arado e da grade niveladora, cujo uso requer a utilização de tratores.

A semeadura, nesse sistema, é feita diretamente sobre a palha, por meio de equipamentos que cortam os resíduos de matéria orgânica e introduzem a semente no solo, de forma precisa, por meio de uma outra técnica avançada, chamada de plantabilidade. 

De acordo com a Federação Brasileira do Sistema Plantio Direto, há no país atualmente 33 milhões de hectares de área cultivada com plantio direto.

Mercado de créditos de carbono

O mercado de créditos de carbono é apontado por especialistas como um dos principais vetores de crescimento do agronegócio para as próximas décadas, sobretudo no Brasil.

De acordo com o CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), a estimativa é que até 2030 a economia de baixo carbono e a proteção de biomas (investimentos verdes) alcancem os R$ 17 bilhões no Brasil.

A compra de créditos de carbono está sendo vista como uma das melhores alternativas para que empresas e países que emitem grandes quantidades de GEEs minimizem os impactos que causam por meio da compra desses créditos.

Assim, um fazendeiro que tem boa parte da sua área agrícola preservada, pode comercializar créditos de carbono, mas isso depende de cada situação, inclusive para a precificação para cada tonelada de carbono e da metodologia de avaliação.

O seu estabelecimento, no entanto, depende de uma regulamentação internacional e uma nacional, no caso, em cada país que faça parte do Acordo de Paris.

O Brasil, em 2022, conseguiu dar um importante passo nesse sentido, com o Decreto 11.075, que, dentre outros objetivos, visa estabelecer procedimentos para a elaboração dos Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas.

A regulação do mercado internacional de créditos de carbono, apesar dos atrasos, já está bem avançada, e deve ser concretizada em 2023, com os acordos da COP27.

A proposta é de a criação de um órgão das Nações Unidas para intermediar a compra e venda de créditos de carbono, o que possibilitará um comércio de créditos de carbono entre países, essencial para a redução da emissão dos GEEs.

Mas mesmo antes das regulamentações internacionais e nacionais, o mercado de crédito de carbono já está ativo, no chamado mercado voluntário, restrito às empresas.

Na COP27, por exemplo, um grupo de empresas anunciou a criação de uma companhia para atuação no mercado voluntário de carbono, com atuação na restauração de áreas degradadas e conservação das florestas no Brasil.

Sistema ILPF

O Sistema ILPF (Integração Lavoura-Pecuária-Floresta) é uma importante inovação voltada para a recuperação de pastagens degradadas, aumento do sequestro de carbono, bem-estar animal e diversificação da produção agrícola na propriedade rural.

Em um mesmo local, o sistema atua com diferentes sistemas produtivos, como o de grãos, produção de leite e carne, fibras, além de geração de bioenergia ou bioinsumos.

Com isso, reduz os riscos de frustração de renda por eventos climáticos ou situações pontuais do mercado internacional, como aumento dos preços dos insumos, do barril do petróleo, guerras, etc.

Por meio da implementação do ILPF, é possível reduzir o uso de defensivos químicos, a abertura de novas áreas de produção e o passivo ambiental, além de aumentar a biodiversidade e controlar melhor os processos erosivos e de cobertura do solo.

Área com Sistema ILPF (Foto: Embrapa)

Manejo Integrado de Pragas – MIP

No Manejo Integrado de Pragas, mais conhecido como MIP, é feita a junção de todas as principais técnicas de controle com o objetivo de reduzir a população de insetos prejudiciais na lavoura e mantê-los abaixo do nível de dano econômico.

O MIP pode ser aplicado a diversas culturas, sobretudo de grãos, e um dos principais benefícios dessa técnica é que ela promove a redução do uso de defensivos químicos, sobretudo inseticidas.

Outra tática importante do MIP é a não utilização corriqueira do mesmo defensivo agrícola, já que isso causa a maior resistência dos insetos.

No MIP, o monitoramento é feito com base na densidade populacional de insetos, em que é avaliado o nível de dano para determinada praga na lavoura.

São feitas amostragens em campo para essa determinação, chamada de NDE (nível de dano econômico), cujo cálculo é o seguinte:

NDE = valor da produção da cultura/valor da aplicação x 100

Não se deve esperar que o NDE seja atingido ou chegue próximo do aceitável para que sejam tomadas ações de controle das pragas – estas, devem ser tomadas logo que identificadas a presença dos insetos, o que pode ser feito de maneira localizada.

Além do monitoramento com MIP, a presença ou detecção das pragas podem ser observadas de forma remota, por meio de imagens de satélite em NDVI (Índice de Vegetação por Diferença Normalizada).

O NDVI, por indicar o desenvolvimento saudável da lavoura, pode apontar áreas problemáticas que precisam de melhor observação local. Ele não indica que tipo de problema há na lavoura, mas sim que algo precisa ser corrigido.

Manejo biológico de pragas e doenças

O manejo biológico de pragas também é de grande relevância para a sustentabilidade e redução de custos com defensivos agrícolas.

Nessa técnica, as pragas agrícolas e insetos transmissores de doenças são controlados com o uso de inimigos naturais, os quais vão desde insetos benéficos e predadores, até parasitoides e microorganismos, como fungos, vírus e bactérias.

Esse método, conforme pesquisas da Embrapa, tem se mostrado racional e sadio, de modo que nos alimentos produzidos não haja resíduos de produtos, sendo assim mais saudável para o consumo humano.

Conclusão

As mudanças climáticas precisam ser cada vez mais encaradas com mais seriedade por parte da sociedade como um todo, sobretudo pelos setores econômicos cujas atividades contribuem para que os seus efeitos se tornem mais graves.

O agronegócio, nesse sentido, necessita ter políticas públicas mais abrangentes, maiores alternativas de financiamentos, assistência técnica especializada e implementação de novas técnicas que favoreçam a uma produção agrícola sustentável.

E isso pode ser feito de diversas formas, tendo a tecnologia como importante aliada para uma gestão eficiente da fazenda.

Só assim será possível o país se manter competitivo e na dianteira da produção agrícola mundial, mesmo diante dos efeitos das mudanças climáticas.

Mario Bittencourt

Analista de Copywriting da Perfarm, é jornalista e pós-graduado em Agricultura de Precisão e em Ciência de Dados. Faz mestrado em Agricultura de Precisão na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

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